sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Nos tempos do integralismo.(II)


Cascudo não renegou o seu passado integralista.

Luiz Gonzaga Cortez

31/12/10

Diversos veículos de comunicação social do país, nos dois últimos anos, principalmente em 1999, em função do seu centenário do nascimento e do quarto centenário de Natal, publicaram reportagens, entrevistas e artigos diversos sobre o escritor natalense Luís da Câmara Cascudo, um dos monumentos da cultura norte-rio-grandense. E por ter sido uma figura de proa da inteligência da terra, Cascudo, que não era gênio, presunçoso, antipático nem vivia com o rei na barriga, como muitos intelectuais conterrâneos, foi uma figura ímpar, simples, modesto e digno. E dentro dessa dignidade, há um detalhe honestíssimo que não pode ser maculado por ninguém: ele jamais renegou a ideologia integralista.

Os intelectuais potiguares que participaram da Ação Integralista Brasileira-AIB ( a versão brasileira das exterioridades do fascismo,  fundada pelo jornalista Plínio Salgado, em 1932) e que tiveram atuações mais destacada foram Luís da Câmara Cascudo, Manuel Rodrigues de Melo, Otto de Brito Guerra, Antonio Soares de Araújo Filho, Edmundo de Melo Lima, Valdemar de Almeida, Hélio Galvão e José Augusto Rodrigues, entre outros. Nenhum deles renegou o seu passado integralista, ideologia que reunia cristianismo, nacionalismo, indianismo, respeito aos grupos étnicos e os direitos humanos, sob o lema de "Deus, Pátria e Família". Há quem assegure que esse lema surgiu numa loja maçônica do Rio de Janeiro, segundo o falecido desembargador Newton Pinto. Havia admiradores de Mussolini e Hitler nas fileiras da AIB em todo o país, entre 1932/1937, principalmente no sul. Gustavo Barroso, historiador cearense, era o principal líder da corrente anti-semita da AIB, o que motivou diversos desentendimentos com Plínio Salgado e gerou uma crise que quase levava ao rompimento total com o seu Chefe, em 1934. Plínio não admitia racismo. 


 

Mas Cascudo, que não teria sido anti-semita ( chegou a participar de cultos no Centro Israelita de Natal, na rua Felipe Camarão, Cidade Alta, mas uma professora do Departamento de História da Universidade Federal do RN detectou indícios de anti-semitismo numa obra de Cascudo) nem foi espião nazista, jamais negou que era um ex-integralista, jamais renegou a ideologia considerada eminentemente brasileira pelo sociólogo Gilberto Freyre e neo-fascista pelos comunistas e esquerdistas de vários matizes (à exceção da cúpula da Igreja Católica brasileira, que incentivou, e de muitos padres, que participaram do movimento), não se tem provas (um rumor, um boato ou uma soprada no ouvido de alguém sério) de que tenha tocado fogo nos livros, jornais, revistas, camisas, emblemas e dísticos integralistas. Foi a partir do final de 1998 que começaram a surgir declarações, atribuídas ao jornalista Fernando Luiz da Câmara Cascudo, filho do folclorista e escritor, de que Cascudo tinha renegado o integralismo e se arrependido de ter vestido camisa verde. Veja bem, somente doze anos depois da morte de Cascudo é que surgiram essas frágeis versões. Em vida, na época em que estavam vivos o dr. Otto Guerra, dr. Clóvis Travassos Sarinho, Manuel Rodrigues, Hélio Galvão e Manuel Genésio Cortez Gomes, quem se atreveu a dizer que Cascudo tinha queimado os documentos e livros integralistas? Ninguém.

Na verdade o que Cascudo abjurou (não confundir com renegou) foi a maçonaria. Nos anos 30/40, Cascudo foi forçado pela Igreja Católica a abjurar a maçonaria, pois caso contrário, não receberia a comenda da Ordem de São Gregório Magno, no grau de Cavaleiro, concedido pelo Vaticano. Informa o historiador Olavo de Medeiros Filho que o bispo de Natal, Dom Marcolino Dantas entregou as comendas a Ulisses Celestino de Góis, Hélio Mamede de Freitas Galvão, Otto de Brito Guerra e Luís da Câmara Cascudo, todos integralistas, na época, após assegurar-se que Cascudinho não era mais maçom. Outra figura conhecida na cidade, mas que não foi integralista, mas abjurou a maçonaria foi o tabelião Theodorico Guilherme, pai do notário José Maria Guilherme, autor do livro "José". Naquela época, ainda existiam ranços da briga da Igreja X Maçonaria ocorrida no século XIX. Em 1939, quando o Vaticano mantinha relações estreitíssimas com o "Duce" Benito Mussolini, Cascudo recebeu a sua mais importante comenda, a de cavaleiro da Coroa da Itália, proposta por Mussolini e aprovada e concedida por Sua Magestade Vittorio Emanuele III, "Per Grazia Di Dio e Per Volontá Della Nazzione". Mas o escritor José Melquíades de Macedo defendeu em fevereiro de 2000, a versão de que Cascudo abandonou a maçonaria, "por outras questões, talvez particulares". Mas em novembro de 2000, no bar de Lourival, o grande professor Melquíades disse que eu tinha razão ( ele se referia às minhas matérias, inclusive este artigo, publicadas nos jornais Diario de Natal e Tribuna do Norte), acrescentando que Theodorico Guilherme também tinha abjurado. O interessante ( não sei se por ironia da história ou desinformação) é que na entrada do prédio do antigo QG da Guarnição do Exército em Natal, a ID/7, onde hoje está o Memorial Câmara Cascudo, em 1988 foi afixada uma placa do Grande Oriente do Estado do Rio Grande do Norte – Federado ao Grande Oriente do Brasil, através da Loja Evolução Segunda (Natal/Rn) com a seguinte legenda: "Homenagem ao Mestre Maçon Luiz da Câmara Cascudo"- Iniciado em 03.04.1920 – Exaltado em 09.09.1921 , Natal, RN, 20 de agosto de 1988, Paulo Viana Nunes, Grão Mestre Estadual.

E mais: na década de 50, quase 20 anos após a extinção da AIB, quando os integralistas estavam reagrupados no Partido de Representação Popular-PRP, também criado por Plínio Salgado, Câmara Cascudo, apesar de afastado da militância política (não se filiou ao PRP), assinava os jornais integralistas Idade Nova e A Marcha. Nas comemorações realizadas em Natal, em outubro de 1957, pelo transcurso dos 25 anos do lançamento do Manifesto Integralista de Outubro de 1932, quando Plínio Salgado lançou as bases de sua ideologia, o escritor Luís da Câmara Cascudo foi um dos mais aplaudidos oradores da solenidade realizada na sede do PRP da capital potiguar. A solenidade foi realizada num prédio do popular bairro do Alecrim, sob o comando de Clóvis Sarinho e do comerciante Rubens Massud. Disse-me uma das testemunhas: "Cascudinho fez um dos discursos mais patrióticos e contagiantes daquela noite. A base do seu discurso foi o lema do integralismo, "Deus, Pátria e Família", que ele considerou atual e que deveria ser cultuado por todos os patriotas brasileiros. Em nenhum momento, Cascudo renegou o integralismo, ao contrário, ele, 25 anos depois do Manifesto de Outubro de 1932, fez a sua defesa radical, diante de centenas de pessoas". Duas testemunhas do caloroso discurso de Cascudo residem em Natal: o aposentado Pedro Dantas (já falecido) e o professor de Direito Cleóbulo Cortez Gomes. Pedro Dantas, administrador do Cemitério Morada da Paz, em Parnamirim/Rn, na manhã do dia 22.04.2000, confirmava: "Cascudo fez um brilhante discurso de improviso e reafirmou, bela e empolgadamente, que continuava integralista". O discurso foi realizado no Alecrim Clube.

Cascudo não gostava de críticas descabidas ao integralismo, principalmente de pessoas que não tinham lido nada sobre a ideologia de Plínio Salgado. "Jamais renegou os seus princípios e não negava a sua condição de ex-integralista", escreveu o falecido médico Clóvis T. Sarinho (Fatos, Episódios e Datas que a memória gravou, Editora Nordeste, 1991, Natal, páginas 183 e 184).

Na série de reportagens que publiquei no Diário de Natal, a partir de 01 de julho de 1984 ( A Pequena História do Integralismo no RN, mais tarde republicadas em livro editado pela Fundação José Augusto e Clima), cometi o deslize de escrever que o Dr. Otto Guerra tinha declarado que Cascudo tinha renegado o integralismo. O Dr. Otto mandou uma carta de desmentido, publicada na edição de O POTI de 08.07.1984, p.10, da qual extraio o seguinte trecho: "...Minha segunda retificação prende-se ao escritor Luís da Câmara Cascudo, antigo e dedicado "Chefe Provincial"do integralismo no Rio Grande do Norte, durante algum tempo. Nunca o ouvi renegar o seu passado integralista, nem tenho provas disso. Num dos seus livros – "Viajando o Sertão"- ele fala abertamente na sua filiação integralista. Note-se que esse livro foi reeditado faz pouco tempo e Cascudo não alterou ou retirou uma linha do que antes escrevera. Seria pois grave injustiça de minha parte atribuir ao meu velho amigo e mestre, a quem tanto devo na minha formação cultural, uma atitude que desconheço".

Eduardo Maffei, escritor paulista, antigo militante comunista, já falecido, esteve em minha residência em março de 1987 e disse-me que admirava muito Cascudo e um dos motivos que lhe causava mais admiração era que ele ainda tinha idéias integralistas (Maffei conheceu-o em Recife, em abril de 1940). O fato de documento do serviço secreto dos Estados Unidos da América, da época da Segunda Guerra, considerar Cascudo como simpatizante da Alemanha (até o Papa Pio XII foi acusado de omissão diante dos crimes do nazismo), não é dado suficiente para considerá-lo como neo-nazista ou germanófilo. A propósito, muitos integralistas do Rio de Janeiro, Natal, Recife e Fernando de Noronha, trabalharam como espiões dos serviços de informações dos americanos instalados no Brasil.

Câmara Cascudo foi um dos intelectuais expoentes da Ação Integralistas Brasileira. Escreveu artigos para as publicações integralistas A Ofensiva, Panorama e Anauê, entre outras, na década de 30, até a extinção da AIB, em novembro de 1937. Apesar de não ter mais de dois mil militantes, os integralistas potiguares conseguiram que Plínio Salgado, candidato à Presidência da República em 1955 pelo PRP obtivesse boa votação em Natal. Tal fato viria influenciar o candidato a governador Aluizio Alves, em 1960, a adotar a camisa verde como símbolo principal da sua memorável e vitoriosa campanha eleitoral. Alguns desses artigos estão reunidos no livro "Câmara Cascudo, jornalista integralista", publicado pelo Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFRN que, segundo o escritor Itamar de Souza, é obra indispensável para se conhecer o lado político de Luiz da Câmara Cascudo.

Observações: artigo revisado após as correções lembradas pelo escritor Sérgio Vasconcelos, em 04.12.2010.

Nos tempos do integralismo.


Cascudo e as músicas populares
Brasileiras.

 

 
Pesquisa de Luiz Gonzaga Cortez, jornalista.

 

 
O potiguar Luiz da Câmara Cascudo, cujo edifício folclórico-literário que construiu na aldeia potengina é de domínio universal, compulsando livros, fuçando bibliotecas e realizando algumas pesquisas de campo, nos anos que a sua juventude permitiu, não só foi comentarista de assuntos políticos nacionais e internacionais quando integrava a Ação Integralista Brasileira, movimento nacionalista criado pelo escritor paulista Plínio Salgado, em 1932 para se contrapor ao avanço do comunismo. Plínio foi um dos principais mentores da Semana de Arte Moderna, em 1922. Para os que não conhecem a nossa História, é bom lembrar que o movimento fascista internacional influenciou ou gerou diversos movimentos nacionais, de direita, revolucionários-nacionalistas e cristãos, apoiado pelos governos e regimes burgueses e capitalistas. No Brasil, o jornalista e escritor Plínio Salgado, católico praticante, após ler Marx e Lenine, e observar o avanço do comunismo, criou a AIB, espelhado no regime fascista de Mussolini, na Itália, que estava abençoado pelo Vaticano. O comunismo deu o primeiro passo no totalitarismo, em 1917, na implantação do regime comunista na Rússia, cujos ideais se espalharam pelo mundo. Pouco tempo depois, em 1926, Mussolini instalou o "fascio" em Roma. Aí, meus amigos, surgiu o totalitarismo de direita. Nesse contexto, Cascudo, católico, ex-monarquista, vestiu a camisa-verde dos integralistas, todos abençoados por Dom Marcolino Dantas e o professor Ulisses de Góis.Além de pesquisador, foi comentarista do primeiro time do jornal A Ofensiva, porta-voz da Ação Integralista Brasileira-AIB (1932-1937), que era editado no Rio de Janeiro. Nas minhas pesquisas sobre esse intelectual conterrâneo, encontrei um artigo de Cascudo sobre a música sertaneja, publicado em 1934, no Rio, e que não era do conhecimento dos pesquisadores da obra cascudiana, salvo engano. Leiam.

 

 
Música Sertaneja

 
Luiz da Câmara Cascudo

 
Música sertaneja, no sentido expresso do termo, nunca existiu. Para dançar dançam o que se dança no litoral. Valsas, polcas, schottichs, quadrilhas, tangos, agora maxixes, fox, rags e até rancheras, que adaptaram às corridinhas da saudosa polca-pulada. Para a sociedade rica, abastada ou mediana, não há maior desdouro que falar em sambas. Sambas não são as danças mas o próprio baile, a reunião festiva. Samba é de gentinha, dizem. O samba primitivo era uma simples dança de roda, herança do índio, em suas danças coletivas, mas sem mulheres. O português colocou o ponto, a parada com a saudação convidando para sair e também trouxe o elemento feminino para o meio. O negro colaborou com a umbigada. Samba vem de semba, que quer dizem umbigo.
A impressão geral da musica sertaneja só se pode ter ouvindo cantadores. A improvisação nos bailes é diminuta e as vitrolas acabaram matando, numa percentagem séria, a facilidade criadora do sertanejo com temas musicais. O que se nota depressa é a acomodação da melodia temática às exigências do ritmo sertanejo, ao compasso ad-libitum, com que estão habituados a fugir da própria quadratura melódica.
Mário de Andrade ("Ensaio sobre a Música Brasileira", págs. 12, 14, etc, "Comp. de Hist. da Musica", pág. 177, etc.) salientou esta coadunação libertadora . Mas distinguiu que se dava sentido melódico, caindo num movimento oratório que ia, reconhece ele, libertando-se da quadratura melódica e até do compasso. Mario registrou brilhantemente este aspecto que, para mim, é uma característica:
...esses processos de ritmica oratória, desprovida de valores de tempo musical contrastavam com a música portuguesa afeiçoada ao mensuralismo tradicional europeu. ... e a gente pode mesmo afirmar que uma ritmica mais livre, sem medição isolada musical era mais da nossa tendência, como provam tantos documentos já perfeitamente brasileiros. Muitos dos cocos, desafios, martelos, toadas, embora se sujeitando à quadratura melódica, funcionam como verdadeiros recitativos.
O Desafio não é espécie musical. É um gênero. Tem várias partes, como uma suíte, diferindo de ritmos e de tipos melódicos. Começa pela colcheia, passa à carretilha, isto é, do setissilabo para as sextilhas e atinge ao martelo, reminiscência perfeitamente clássica que o sertanejo não inventou mas recebeu dos portugueses. O martelo, com rimas alternadas, vai desde seis a dez versos em alexandrinos. O desenho melódico obrigatoriamente se modifica e, às vezes, inteiramente. O instrumento de acompanhamento, no desafio é a viola apenas; jamais solam, mas seguem em acordes menores, o recitativo puro da chamada cantoria.
Um Cantador famoso não se serve da viola senão nos intervalos das frases recitadas. Termina o canto numa fermata ou num ralentando, ambos guturais, acrescidos pelo processo de nasalação que é tão comum que melhor se dirá natural. A viola é de pinho, com seis cordas-duplas de aço, afinada por quartas, com dez e doze trastos no braço.
A preferência do cantador sertanejo, e da maioria absoluta das modinhas e cantos populares é para os tons menores, dó, ré, lá.
Os temas são deliciosamente simples. A maior influência portuguesa ainda é notada nas rodas infantis. O negro e o índio são os responsáveis pelo ritmo profundo, a obstinação rítmica que, sendo libertada pela expansão dos recitativos, nem por isso diminui de intensidade e segurança. Mas o negro, todos sabem, é mais escravo do ritmo. Veio da percussão.
O ritmo, que Mario de Andrade encontrou como a expressão mais positiva no Brasil, a síncope de sime-mínima entre colcheias no primeiro tempo de dois-por-quatro, leva para a constância da nossa melódica popular, o movimento descendente de sons rebatidos, igualmente notado pelo erudito professor do Conservatório de São Paulo.
O desenho simples não exclue a pureza, a sobriedade incrivelmente melódica, inesquecível e linda. Certas linhas são verdadeiras obras primas de naturalidade, de doçura, a um tempo meiga e triste. Nenhum traço tipicamente sertanejo em assunto musical e alegre. Tem um abrandamento, um trabalho preliminar de melancolia, para ficar ao gosto de todos. A porção maior das modinhas é em menor. Os melhores sambas de emboladas são menores. No auto popular do Bumba-Meu-Boi os tons menores são dominantes. Mario de Andrade teve a felicidade de reparar que substituímos a franqueza impositiva do português pela delicadeza mais mole e familiar. No linguajar diário dizemos mi-dê, vá-se imbóra por dê-me e vai-te embora.Assim em música o sertanejo troca a tônica presente pela mediante tonal, dando um ambiente inenarrável de malinconia.
Vivas, arrebatadas, impulsivas, folionas, o sertão só conhece as rondas das crianças.Os brinquedos-de-rodas, cirandas, ponte-da-liança, a moda-da-carrasquinha, bom-barquinho são todos em tons maiores,estimuladores de movimento e de vida. Parece, por uma ironia sutil, que desejamos dar às crianças um ambiente de despreocupação e de vivacidade irreesponsável. Homens, só saberão cantar em tons merencórios.
Daí um cantador sertanejo afirmar que: a princípio são fulôres

A choradêra é no fim...

 
Transcrito do jornal porta-voz da Ação Integralista Brasileira, Rio de Janeiro, fundado por Plínio Salgado, A Ofensiva, de 05 de julho de 1934, p.8. Reescrito em 31.12.2010.

domingo, 26 de dezembro de 2010

Araponga canta como

um espião trabalha?

Luiz Gonzaga Cortez Gomes (*)


 

Observando o noticiário da imprensa nacional , os seus estrangeirismos, as suas copiações, os seus modismos e suas frescurites, além dos artigos e ensaios sérios, proveitosos, históricos e/ou culturais. Diante da série de escândalos em diversas esferas , nos últimos meses, o me chama atenção é o emprego da expressão "Araponga" para designar o agente público ou privado que se dedica a investigações policiais, a ações de espionagens legais e ilegais. Sobre esses agentes policiais e militares dos DOPS e DOI-CODI e similares, a imprensa alternativa, no final dos anos setenta do século passado, criou o apelido pejorativo de "dedo duro", objetivando menoscabar o trabalho desenvolvido pelos "agentes secretos" do regime. Com o fim do regime autoritário, a imprensa começou a tachar os espiões do governo (da ABIN, PF, polícias civis e militares de todo o Brasil, sem distinção) de "araponga". Bom, eu fiquei matutando: qual a similaridade da ave (a araponga é nosso ferreiro, o sabiá, segundo um especialista) com o trabalho do espião que, no meu entendimento, trabalha em silêncio, clandestina e anonimamente? A araponga é uma ave de canto estridente e metálico.

Você duvida? Então, leiamos o mestre Aurélio, na página 106 da 6ª edição do seu Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa (exe. s/d): "Araponga, s.f. (Bras.) Ave da família dos Cotingídeos (Chasmarhyneus nudicolis), também chamada ferreiro e ferrador, notável pelo som metálico do seu canto; (fig.) pessoa de voz estridente ou que fala gritando". Alguma dúvida, ainda? Como, então, fazer-se a comparação? Estou procurando a resposta. Procurei encontrá-la nos versos da música de Penas do Tiê, graças a ajuda de Eugênio Lima, quase doutor quase em música. "Vocês já viram lá na mata a cantoria da passarada quando vai anoitecer/ E já ouviram o canto triste da araponga anunciando que na terra vai chover.

Já experimentaram gabiroba bem madura, já viram as tardes quando vai anoitecer

E já sentiram das planícies orvalhadas o cheiro doce da frutinha muçambê...". A composição é de Keckel Tavares, foi gravada por Luís Gonzaga e Fagner (este está sendo processado pela família de Heckel por plágio). Não achei nenhuma analogia. Procurei em vários sítios da internet, nada. O leitor vai se deliciar com as referências à araponga. Há um sítio que informa sobre plumagem, hábitos, alimentação e cuidados com a araponga, sendo que um deles aconselha a criar a ave em cativeiro, pois" a plumagem é bonita e fica muita mansa". "Araponga é conhecida em todo o Brasil pelo seu grito alto e estridente. Fora de São Paulo, em outras regiões do país, ela é conhecida por Guiraponga, Ferreiro ou Ferrador, sendo que esses dois últimos nomes vêm do seu grito, que imita com perfeição o trabalho de um ferreiro, primeiramente com uma lima e a seguir com a batida estridente de um martelo sobre a bigorna. O nome araponga é indígena e vem de ara (ave) e ponga (soar)". No Brasil, há as espécimes procnias nudicolis, desde a Bahia ao Rio Grande do Sul; as procnias averano (Roraima e Nordeste), cujo habitat natural são as árvores (as arapongas não gostam de descer ao chão). Elas são bonitas: tem as asas pretas, peito branco, cabeça marrom e vários apêndices carnudos que "nascem" do seu pescoço como se fossem barba, de onde vem seu nome popular de "Araponga de Barbela". A terceira espécie é a procnias Alba, que habita o Amazonas na região do Rio Negro , mas pouco se sabe sobre ela. O potiguar pode procurar araponga nas poucas matas do litoral. Em Natal, o ecologista pode armar o seu "alçapão" no antigo Morro das Almas, hoje apelidado de Parque das Dunas. Coisa muito fácil de fazer. O natalense Alberto Lima de Souza, médico, parente meu, criador de passarinhos desde a infância, disse que na mata do Tirol podem ser encontradas ferreiros e sabiás, "aves da mesma família, da família dos Cotingídeos (Contingidae. É o Procnias nudicolis. È provável que tenha habitadoem tempois idos a nossa mata atlântica, enquanto existiam frutas de sua alimentação, Já os sabiás são aves mais delicadas nos hábitos e no canto mavioso. São da família dos Turbídeos (gênero Turdus, família Turdidae). Há uma outra ave da família Mimidae, Imitador), conhecido como sabiá da praia (Mimus saturninus). Este é encontrado facilmente nas nossas praias, gostando mesmo do convívio humano. Defronte a casa de Regina (irmã de Alberto) vislumbrei um que cantava como ninguém. Em Natal, nas matas do Tirol, habitam em profusão duas espécies de Turdus: o Turdus amaurocalinus ( sabiá de bico amarelo, sabiá poca) e o Turdus fumigatus (sabiá da mata), o sabiá que vovó chorava quando ouvia o canto. Na nossa casa em Tirol, havia um ipê roxo que era habitado por um sabiá da mata que cantava como nenhum. Era este que vovó Zefinha evocava e imitava o canto, talvez se lembrando de episódios da sua infância. O sabiá laranjeira (Turdus rufiventris) também existe no Rio Grande do Norte, em sítios e fazendas, habitando capoeiras e fazendo seus ninhos próximos das habitações humanas. Bem, meu caro Gonzaga: é o que lhe posso informar por enquanto. Um abraço grande e sempre ao seu dispor. Do primo que lhe quer bem. Alberto Lima".

Também consultei o professor e linguista Roberto de Souza Lima, irmão de Alberto, outro homem que, além de compositor, músico, cantor e intelectual, sabe história geral. À minha pergunta sobre espionagem e arapongagem, no Brasil, ele respondeu o seguinte: "Sabemos que na Europa, desde muitos anos, o FALCÃO foi utilizado para enviar mensagens,algumas até codificadas, para evitar o seu conhecimento, caso a ave caísse em mãos inimigas. Essas aves, posteriormente adestradas até para a espionagem. Com a organização das "Inteligências", muitos agentes, por analogia, passaram a receber codinomes tipo: Falcão Dourado, depois "Á guia Azul", etc. Por uma mera conjectura, acredito que ARAPONGA seja apenas uma versão tupiniquim para denominar os agentes espiões, uma vez que essa ave é tipicamente brasileira. Grande abraço. Roberto Lima".

Cabe ao leitor tirar suas deduções. O que tem a ver araponga com um espião armado, desarmado, com gravadores, grampos para escutas telefônicas, malas de 30 mil dólares para escutas ambientais, binóculos e lunetas de longo alcance, carros com placas frias e películas fumês, novos e turbinados? O que tem a ver uma ave que vive sobre árvores, em áreas próximas ao litoral, com ar puro e se alimenta de frutos nativos com agentes da segurança

Interna e externa, com fones nos ouvidos, ouvindo as conversas alheias, com ou sem autorização judicial, no interior de salas com ar-condicionado? Você sabe?

*Luiz Gonzaga Cortez.

É jornalista e pesquisador.

O Pássaro Branco.

 


 

O "PÁSSARO BRANCO"


 

Laélio Ferreira (pesquisador, poeta)
 

Numa madrugada de muita chuva e relâmpago, voando baixo e sem nenhuma visibilidade, o monomotor Breguet passou por cima de Parnamirim, roncando.  Pouco depois, no lusco-fusco do alvorecer, os poucos moradores da Fazenda "Maracujá", em Santo Antônio do Salto da Onça, assombrados, ouviram o rojo daquele "bicho do céu" torando mato ralo no tabuleiro até parar, fumaçando, nas moitas de xiquexique.

Correu, todo mundo, para acudir. Um dos aviadores, socorrido pelo colega,  gemia baixo, com profundo corte na testa. Destroçado, o avião, pintado de branco, tinha,  na fuselagem, a figura azulada de um pássaro e uma legenda: "L'Oiseau Blanche"  ("O Pássaro Branco").

Começara mal, para os tripulantes, o raiar do dia 17 de dezembro de 1929. Voando a 150 kms por hora, com um moderníssimo motor Lorraine de 450 HPs, tinham saído de Sevilha (La Tablada), na Espanha, 48 horas antes da queda, ao meio-dia de 15 de dezembro. Haviam sobrevoado o Marrocos e a Mauritânia – de onde, em Port Etienne, embicaram na direção da América do Sul. Natal e Parnamirim serviriam apenas como pontos de referência. A meta, o recorde que buscavam, era chegar a Montevidéu, no Uruguai,  sem escalas. São Pedro e a tempestade não permitiram! Viram, de longe, do mar, o piscar do farol da Fortaleza dos Reis Magos. Neca de Parnamirim, da pista dos franceses da Aeropostale! Tudo breu, escuridão!

Molhado, sangrando na testa, o fidalgo Capitão León Challe, do Exército francês, herói condecorado na Grande Guerra, filho de general, detentor de mais de uma dezena de recordes mundiais de aviação, é acolhido com carinho por um casal de velhos, na humilde casinha de taipa e chão batido. O Tenente-Coronel Tydeo Larre Borges, do Exército uruguaio, na solidária companhia de vaqueiros, vai pedir socorro na vizinha Fazenda "Jucá", de Epaminondas Martins, por coincidência Prefeito do município.

Larre Borges, nesse final de década (1929), já era figura legendária no Uruguai e tinha, tanto quanto o francês Challe, renome internacional. Dois anos antes, em 03 de março de 1927, comandando um hidroavião, o "Uruguay", caiu no litoral marroquino (Guad Fatma) e com   três companheiros de vôo foi capturado por nômades do deserto, que pediram resgate de 5.000 pesetas ao governo do Marrocos Espanhol. No dia 05, os franceses da Aeropostale, Ville e Mermoz, baseados em Cap Juby, localizaram os restos da aeronave. Presos aos lombos de camelos, os uruguaios foram localizados, do ar, no dia 07, por Guillaumet e Riguelle. Exupéry – aquele mesmo, o do "Pequeno Príncipe" - e Reine, no dia seguinte, chegam ao acampamento dos seqüestradores, em Puerto Casando, para negociar. Os árabes, alvoroçados, resolvem aumentar o preço para a soltura de Larre e seus companheiros. Estabelecida a confusão, três reféns correm para o Breguet de Reine. Borges, num golpe de sorte, entre tiros e desaforos em três idiomas, também se escafede no outro avião, com Saint-Exupéry.

Um dos pilotos resgatados foi o Capitão José Luis Ibarra. Coincidentemente ele e Larre Borges foram, no Campo dos Afonsos, colegas de turma do Sargento João Menezes, falecido em 1920, natalense, com quem fizeram larga amizade, no Rio. O diabo é que – vamos ver - a terra do Sargento não tratou muito bem o oficial uruguaio!

Depois da estadia forçada no Rio Grande do Norte, obtendo alta León Challe, partiram os aviadores, no dia 22, para Montevidéu, onde foram homenageados. Além do pouso não previsto,  do acidente, um incidente lamentável marcaria a passagem do futuro Brigadier General Larre Borges por Natal. Sem dúvida dolorido na alma e no corpo, acompanhando, no hospital, o tratamento do companheiro francês e amargando a derrota por não ter concluído o reide, ao não aceitar um intempestivo e provinciano convite para "um banquete de homenagem" na Escola Doméstica de Natal – na época era "chiquérrimo" ! –, o grande aviador entrou em rota de colisão com os costumes locais, provocando a ira da elite e o conseqüente ataque impiedoso da imprensa, açulada pelo padre João da Matta.

Dias depois, de Montevidéu, com elegância, procurou desfazer o "imbróglio" constrangedor. Em cartas aos jornais da cidade, em bom português, afiançou a antiga admiração pelo Brasil, a convivência cordial com os brasileiros e a passagem pelo Campo dos Afonsos, revelando, ainda – para surpresa de muitos – ser a esposa (Elena Gallarreta Urrutia), a mãe dos seus filhos, brasileira ! Morreu de saudade, o Brigadier General, em 1984, aos noventa anos, uma semana depois da morte da sua Elena – com quem viveu setenta.



 

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Maria do Céu, uma curraisnovense de caráter.

Maria do Céu não viu aparecer

nenhum herói na insurreição


 

Luiz Gonzaga Cortez *


 

No dia 21 de abril de 1987, Maria do Céu Pereira Fernandes, que foi a primeira deputada estadual do Rio Grande do Norte, irmã do falecido ex-governador José Cortez Pereira de Araújo (filha de Olindina Pegado Cortez, irmã da minha avó paterna), prima legítima do meu pai, Manoel Genésio Cortez Gomes, me concedeu uma entrevista na residência do seu filho Paulo de Tarso, em Natal, publicada no extinto semanário Dois Pontos. Eis o teor da entrevista:

Como a sociedade recebeu o lançamento da sua candidatura pelo Partido Popular?

MC – Naquele tempo, eu fazia o que queria. Lia livros proibidos, inclusive sobre comunismo e Freud. Sobre comunismo, por exemplo, eu li muito, mas não aceitei a ideologia. Mas sobre a receptividade da minha candidatura posso dizer que os remanescentes do tradicionalismo não aceitaram. Houve um certo impacto no começo, mas depois a Igreja aceitou. Não houve choque nenhum, todos aceitaram.

E o seu pai, político tradicional e conhecido coronel da política de Currais Novos, como viu a sua candidatura?

MC – Eu tinha 24 anos naquela época. Sou de novembro de 1910. Papai não queria que eu fosse candidata, mas não tomei conhecimento porque o que eu fazia era o que achava certo. Veja bem, em 1934, eu tinha amigos e amigas, o que não era comum naquele tempo. Com amigos, eu passeava e viajava. Você já pensou uma mulher de 24 anos passear na cidade com amigos? Passeava com Mário Porto, Eider Trindade e outros grandes amigos. Fui eleita com o apoio do meu pai, Vivaldo Pereira, e do meu noivo, Aristófanes Fernandes.

Logo após a eleição dos deputados para a Assembléia Constituinte Estadual ocorreu a revolta dos cabos e soldados do 21º Batalhão de Caçadores do Exército, em Natal. Como a sra. viu a revolta?

MC – Até gostei de ter havido a revolução comunista. Eu gostei que os comunistas tivessem se rebelado. Gostei porque eles eram idealistas, mas não porque quisesse participar, não. O Brasil estava se tornando horrível. Lendo o livro "Olga", de Fernando Morais, a gente fica sabendo como os comunistas eram idealistas, mas não tinham meios, coitados, de dominar o Brasil. Como eles iriam vencer num país-continente como o nosso? Como iriam arregimentar gente e recursos para que pudesse haver um congraçamento de norte a sul? Se eles tivessem se levantado de norte a sul, teriam conseguido a vitória. E foi bom assim porque o povo brasileiro não está preparado para o comunismo. Ainda hoje o Brasil não comporta o regime comunista, mesmo com toda a miséria e ignorância.

A sra. tem alguma admiração pelo comunismo?

MC – Há muita coisa que não aceitamos no comunismo da União Soviética e de Cuba. Eu tenho uma admiração e entusiasmo por Fidel Castro. Cuba não é o regime ideal, mas só o fato de Fidel tirar o povo da situação anterior já é grande coisa.

A sra. era de direita?

MC – É, eu era de direita total. Hoje sou de esquerda. Meu pai era um homem de direita, de muita autoridade, mas eu não baixava a cabeça pra ele; ele me ouvia e não discutia comigo, mas era um tipo de patriarca. Embora como pai tivesse ternura pelos filhos, mantinha uma certa distância de nós. (Em 1924, perdi a minha mãe e passei a confiar mais no meu pai).

Que lições tirou desse período?

MC – Casada, procurando aproveitar uma outra situação, escondendo o real, aprendi a "engolir" alguns fatos, a aparentar outra coisa, aquilo que não estava mais vivendo. Quase fico maluca (risos). Não tenho porque alimentar minhocas, cheguei aos 76 anos de idade e não há mais o que mudar. Boto tudo pra fora o que sinto. E vou continuar assim, embora ache que esteja perto de terminar.

Que conselhos a sra. daria às mulheres de hoje?

MC – A mulher deve ser rebelde até certo ponto. Quando ela está convicta que seus objetivos estão certos, deve lutar até o fim. Apesar de sempre ter sido uma mulher rebelde, eu vivi muito bem com o meu marido.

E a política daquele tempo?

MC – Naquele tempo se pensava em fazer alguma coisa pelo povo, mas isso já era utópico. Quando se entra no governo, a gente pensa muito pelos pobres. Por isso, aconselho Geraldo Melo, em que não votei porque não me recadastrei, que olhe mais para quem não tem e olhe menos para quem tem muito. Hoje só se faz política com muito dinheiro, só se elege quem tem dinheiro. Naquele tempo, os coronéis mandavam na política, mandavam votar em quem eles queriam, mas não se comprava votos. As campanhas eram bonitas. Fazíamos campanhas e comícios em cima de caminhões. E assim a gente falava para o povo e pedia votos.

A história registra que a campanha política de 1934 foi muito agitada. Há o famoso episódio do tiroteio de Parelhas que redundou numa morte.

MC – Eu não fui a Parelhas, fiquei em Acari. Por isso, não posso falar sobre esse tiroteio.

E o governo Mário Câmara, antecessor de Rafael Fernandes, cuja administração a sra. apoiou como membro da bancada do Partido Popular?

MC – Se foi um período de violências, eu não sei. Acho que houve alguma violência, mas há muitas controvérsias sobre isso, não é? Houve o caso do assassinato do filho de Juvenal Lamartine, Otávio, mas um grande amigo meu constituinte daquele tempo, rebate essa acusação de que Mário Câmara foi o responsável. Fomos obrigados a ir para a Paraíba, por causa da tensão reinante em Natal. Na Paraíba, o governador Argemiro Figueiredo, recebeu e hospedou os 14 deputados do Partido Popular. Forças federais garantiram o regresso a Natal, que encontramos deserta. Aqui, os 14 deputados ficaram hospedados na casa de Alberto Roselli, amigo nosso. A casa ficava no Grande Ponto e, no dia seguinte, muita gente querendo nos ver. Ficamos na casa de Alberto Roselli até o dia da votação indireta na Assembléia Legislativa, que funcionava na rua Junqueira Ayres, onde hoje está a Ordem dos Advogados. A eleição dos deputados foi muito agitada, mas a eleição de Rafael Fernandes foi pacífica. Os catorze deputados ficaram unidos e coesos e elegemos Rafael Fernandes por um voto de maioria. Foi uma vitória sofrida e bonita. Depois da votação, saímos do prédio da Assembléia para buscar Rafael Fernandes. No meio desse povo, eu era a única mulher.

A sra. recebeu ameaça de morte?

MC – Bom, na época da campanha houve algumas ameaças. Por três vezes, entraram na minha residência para me seqüestrar. Uma vez senti que um homem estava no banheiro da minha casa e gritei. As pessoas que estavam em minha casa viram o homem pulando o muro e desaparecer, na rua 13 de Maio (hoje Princesa Isabel). Em seguida, forças federais vigiaram a minha casa até 1935.

Acredita que as demissões de guardas civis, nomeados por Mário Câmara, precipitaram a insurreição do 21º BC?

MC – A insurreição de 35 não foi eminentemente comunista. A coisa já vinha lá do sul, mas aqui anteciparam um pouco, pois não era para estourar no dia 23 de novembro. Essa antecipação favoreceu o governo de Getúlio Vargas, pois se eles estivessem articulados de norte a sul, acredito que não teria fracassado. Mas voltando ao caso das demissões dos guardas civis, creio que eles favoreceram a rebelião. Na época, eu disse ao monsenhor Mata (presidente da Assembléia Legislativa e membro do PP): "Sou uma pessoa disciplinada, mas não aceito certas coisas. Eu não sou uma ovelha que segue um só rebanho para deixar de lado a minha discordância com as demissões. Quanto a antecipação da revolta por causa das demissões feitas pelo governador Rafael Fernandes, não posso garantir, mas pode ter influenciado. Foram mais de 300 pais de famílias demitidos em poucos dias.

Chegou a ver atos de heroísmo durante a revolta?

MC – Não. Quando estourou a revolução eu estava no Teatro Carlos Gomes. Fui obrigada, muitas vezes, a me arrastar e me esgueirar no meio do mato. Chegamos na casa de José Mesquita, na avenida Deodoro, onde hoje fica o edifício Chácara 402. Passamos o resto da noite lá e, de manhã cedo, caminhamos para a praia do Meio. Durante o governo revolucionário não sofremos nada, não sei porque. Sabíamos que um dos líderes da revolução era José Macedo, natural de Santana do Matos e, parece, que ele mandou que a nossa família fosse respeitada. Dos quatro dias que passamos na praia só me lembro que faltaram alguns alimentos em Natal. Soube que alguns seguidores de José Augusto, do Partido Popular, em Macaíba, participaram da insurreição, mas não sei porque. Por ouvir dizer, em Macaíba, sei da participação de Alfredo Mesquita na insurreição. A insurreição comunista foi uma surpresa para muita gente. Eu lia muito e sabia que alguma coisa iria acontecer, mas que não rebentaria na noite do dia 23 de novembro de 1935. Quanto a heróis, desconheço que tenha aparecido algum em Natal, durante a revolução comunista.


 


 

*Luiz Gonzaga Cortez é jornalista e pesquisador.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Navio encalhado é atração em Búzios/RN.

Um navio pesqueiro, de bandeira Nigeriana, está encalhado na praia de Búzios/RN, a 30 quilometros de Natal, há de um ano e tornou-se local de pesca amadora, nas marés altas. Muitos turistas nordestinos estão conhecendo a praia que tem bons restaurantes e locais de hospedagens. Os interessados podem se informar com Gonzaga (foto), através do fone (84) 9914.3141. Os veranistas estão se articulando para a realização de serestas nas noites de lua cheia de dezembro/janeiro/fevereiro/março de 2011.Posted by Picasa

Soletra, de Ana Maria.

SOLETRA

Solícita
Solidão
Soldar
Soldado

Sol
Solar
No ar do sol

GIRA SOL
GIRA SÓ

Na lareira
No lar
No letreiro
Luminoso

SÓ LETRA

Solidária
Solitária
Só lidar
Só lido
Sol dado

GIRASSOL
GIRASSÓIS

Na ladeira
Sem eira
Beirando o sol
Brandamente
Eternamente
Solenemente.

Monumento ao Trabalhador
                                     (Palácio da Alvorada)

Em Brasília, eu piso
Na arquitetura
Da amargura
Com ternura.

Entro na Catedral
Espio os dédalos
no piso dos mal-tratados.
Nesse espaço ecoam-se
Como num badalar de sinos
As súplicas, as preces
Do meu funeral.


Passeio no meio
dos corpos pisados
esmagados nos arcos
arcados por gentes
indigentes
entrados na terra
desvirginada.

Ali se enterraram
sem um lamento
por falta de tempo
ficaram esquecidos
entre muros erguidos.

Em Brasília , eu piso
nos sonhos realizados
debaixo dos meus pés.

Em Brasília, estou também morto
e ficarei por séculos, decerto.
Pensa em mim
quando pisares no meu corpo.

Eu que pensava no futuro
mas é para ti que deixo
Brasília e  minha terra abandonada.

Estou emabixo da mata cortada
meu cemitério, última morada.
Pisa de mansinho
pois eu também amei
e para ti construí
uma nova alvorada.


****************************
Soletra e Monumento ao Trabalhador são dois poemas das págs. 32 e 51 do livro "A poesia é uma história para contar - 54 poemas", de Ana Maria Cortez Gomes, editado "Quarteto Editora" e apoio da União Brasileira de Escritores-UBE/PE, que foi lançado em Salvador, Recife e Natal, em março de 2010, a.Exemplares do livro podem ser solicitados via imeio: quarteto.livros@compos.com.br ou pelo telefone (71) 3452-0220 (fax) 3353-5364.
Ama Maria Cortez nasceu em Natal, onde fez os estudos secundários, diplomou-se em Letras pela Universidade Católica de Recife e fez os estudos  de Pós-Graduação na França - Licence ès Lettres (Besançon), Certificat niveau Maitrise (Université Paris IV), Mestrado (Université Paris VIII) e Doutorado( iniciou na Université Paris V, com André Martinet, e concluiu na Université Paris VIII- , país no qual passou a exercer a sua vida profissional (trecho da orelha do livro assinada por Suzana Alice Marcelino Cardoso, professora emérita da Universidade Federal da Bahia).

Poemas de Ana Maria Cortez.

Aos meus pais
Genésio e Natividade.

Aqui jazem as minhas folhas de papel
De tão branquinhas
Ficaram amarelecidas
Jazidas com pedras cor de mel
Fontes de minas de amarguras
Transformadas em ternuras
Mil vezes manuseadas
Lapidadas
Todas elas jazem com flores
com sabores

com as suas cores
- o azul do céu.




ZILA MAMEDE

Da flor da terra
Na doçura das rosas
Na sombra das árvores
Nas ondas das águas
meu dia  se encerra.

Depressa me fui
Dos laços da vida
|Do regaço das dores
Dos passos da rua
Dos sons das cigarras.

Das vezes do dia
Do quotidiano do mês
Dos repentes do ano
Me separei.

Na poesia\
Abstraí-me.

Transcrições das páginas 12 e 24 do livro "A poesia é uma história para contar  - 54 poemas", de Ana Maria Cortez, uma das filhas poetisa de Nati Cortez (1914-1988), residente em Paris-França, desde 1966.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Grupo de cientistas e dirigentes da Fundação de Apoio à Pesquisa do RN, em setembro de 2009, após a palestra do engenheiro Carlos Alberto Paz de Araújo, no auditório do antigo CEFET de Natal, hoje IFTRN (Instituto Federal de Educação e Tecnologia do Rio Grande do Norte. Carlos Paz é natalense, PHD em física e um dos inventores dos cartões magnéticos e dos responsáveis pelo desenvolvimento de sistemas ferroelétricos. È professor da Universidade do Colorado-EUA. A Simetrix, empresa da qual é sócio Carlos Paz, também diversas pesquisas a nível mundial, inclusive no desenvolvimento de novos combustíveis de origem vegetal, nos Estados Unidos e Austrália. Da esquerda para a direita, o professor Lacerda Felipe, o físico Liacir dos Santos Lucena, a professora Isaura A. Rosado Maia, Carlos Paz, o físico e astrofísico Renan de Medeiros e representantes do IFTRN e Governo do Estado. Foto de Luiz Gonzaga Cortez.
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Os potiguares Rinaldo Montenegro Pegado e Abdenego Fernandes visitaram o condomínio "Àguas da Serra", em meados de 2009, conhecendo algumas residências construídas e/ou em construção. O condomínio está situado na antiga Fazenda Bebedouro, zona rural de Bananeiras/PB, com clima frio entre maio e setembro. Foto de Luiz Gonzaga Cortez.
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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Dois pesquisadores

O jornalista Luiz Gonzaga Cortez e o jurista Carlos Roberto de Miranda Gomes em encontro realizado no Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. O dr. Carlos Miranda e Ormuz Simonetti, este presidente, são os baluartes do Instituto Norteriograndense de Genealogia, que necessita de mais participação do seu quadro social nas reuniões que estão realizadas na biblioteca particular de Miranda. A pretensão de Ormuz é dotar o ING de uma sede própria brevemente, após tornar a entidade de utilidade pública no âmbito estadual e municipal.
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sábado, 18 de setembro de 2010

Pesquisadores

Um grupo de pesquisadores dos sítios arqueológicos do Rio Grande do Norte, fundado em 2008, por iniciativa do jornalista Arlindo de Melo Freire, chegou a realizar uma viagem ao município de Santana dos Matos, onde visitaram cavernas e coletaram dados sobre alguns dos 211 sítios. È o município potiguar que tem mais sítios arqueológicos no Nordeste

. Mas não passou disso: uma ata de fundação e algumas reuniões. Foi extinto? Não sei, mas não houve mais interesse do seu criador, até prova em contrário. Na foto, vê-se Luiz Gonzaga Cortez, jornalista, Arlindo de Melo Freire, Rosáfico Saldanha, professor dfe geografia e pesquusador, poeta e artista plástico, e o jovem historiador Caio Cesar Gabriel. A foto foi feita na cozinha do IDEMA, em Natal.
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sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Neurociências

Natal: Da Cidade do Sol à Cidade do Cérebro


Por Safira e Paul Ammann, Natal, Brasil

Foto: Os autores na sala de exposição de artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

CONTEXTO

Safira Bezerra Ammann nasceu em Caicó (Rio Grande do Norte) e Paul Ammann em Davos. Ela é socióloga e assistente social, ele sociólogo e economista. Ela foi professora das Universidades de Brasília e do Rio Grande do Norte e pesquisadora da Universidade de Fribourg na Suíça. Foi colaboradora científica na Secretaria de Estado dos Refugiados Políticos de Fribourg. Escreveu seis livros, sendo dois em co-autoria com Paul Ammann.

Paul Ammann trabalhou nos Ministérios do Trabalho do Brasil e da Suíça, nas Secretarias de Saúde Pública de Berna e do Rio Grande do Norte, no CNPq e SENAI em Brasília. Publicou artigos no Brasil, na Suíça, Alemanha, Indonésia e nos Estados Unidos.
No último artigo descrevemos a cidade suíça de Davos como “Cidade da Ciência”. Esta vez apresentamos a “Cidade do Cérebro”, como vem sendo denominada Natal, a capital do Rio Grande do Norte, em pleno Nordeste brasileiro. A denominação deve-se ao fato de ter sido nela inaugurado em fevereiro 2007 o Instituto Internacional de Neurociências de Natal – IINN e terem sido realizados dois Simpósios Internacionais de Neurociências, com a participação de 25 cientistas palestrantes, dos quais três suíços (do Instituto Cérebro e Mente da Escola Politécnica Federal de Lausanne e do Centro de Pesquisa da Nestlé), além de 300 pesquisadores brasileiros e 400 ouvintes.

O paulista Miguel Nicolelis, fundador do IINN

O fundador do IINN é o professor Miguel Nicolelis, 45 anos, nascido em São Paulo, formado médico pela Universidade daquela cidade em 1984 e respeitado neurobiólogo da Universidade Duke dos Estados Unidos. Ofereceu importantes contribuições à neurociência básica e é considerado um dos maiores especialistas do mundo nas experiências com microeletrodos neurais implantados em macacos, visando o desenvolvimento de próteses ou membros robóticos para seres humanos, tais como braços e pernas artificiais comandados diretamente pelo cérebro, pensamento ou vontade.

Nicolelis é considerado o “sonhador-mor” do Instituto de Neurociências em Natal, contando com dois outros cientistas, colegas nos Estados Unidos, Cláudio Mello e Sidarta Ribeiro, o último atualmente diretor do IINN. Com eles, inicialmente trabalham 12 pesquisadores.

Quais as aplicações da neurociência em Natal?

Em primeiro lugar, o Instituto não pretende ser um centro que em pouco tempo se transforme em um elefante branco, uma torre de marfim que serve meramente para abrigar cientistas. O Instituto tem “como objetivo a gestão de recursos próprios e de terceiros para a implantação de projetos sociais e de pesquisa científica. Fundamenta-se na concepção de que a ciência de ponta pode, em países em desenvolvimento como o Brasil, servir como um poderoso agente de transformação social e econômica de comunidades localizadas em regiões carentes do território nacional” (veja link Revista Pesquisa Fapesp). Interdisciplinar e inserido na sociedade, o IINN oferecerá um projeto de educação científica infanto-juvenil para crianças da rede pública, o primeiro do Brasil, um centro de educação básica e um centro de saúde materno-infantil.

O Instituto, interligado com os principais centros de neurociência do mundo, trabalha com pesquisa de ponta e aplicação imediata dos resultados na população em todos os níveis de ensino. “O lema é o uso da ciência como um agente de transformação social”. Conforme Nicolelis “essas crianças vão navegar no meio da criatividade. Se um garoto revelar-se um gênio da astronomia, ele não vai fazer Física na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Será o nosso astrônomo” (veja link Carta Capital). Nicolelis tem certeza de que as crianças “serão cientistas com o que tiveram na mão. Aprenderão biologia a partir da análise do solo do bairro onde moram para que percebam quanta vida existe em um pedaço de terra. Com um telescópio olharão para o céu e passarão à matemática. O que falta é mostrar que a ciência é fruto da combinação de talento, paixão, perseverança e, sobretudo, interesse.” (veja Isto É 10/01/2007, no link IINN).

Por que foi escolhida Natal como Cidade do Cérebro?

Nicolelis tinha o sonho de um dia trazer de volta para o Brasil o que ele aprendeu lá fora, não somente a mais avançada neurociência, mas também a gestão cientifica, a busca da excelência e a consciência de que a ciência faz parte da equação da soberania de uma nação e de uma região, sobretudo quando ela é pobre. A idéia é aplicar a pesquisa da neurociência e seus resultados em regiões com os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil.

De fato, todos os índices que compõem o Índice de Desenvolvimento Humano do Estado do Rio Grande do Norte são inferiores à média nacional, ocorrendo as maiores diferenças justamente no IDH-Educação e no IDH-Renda. No município de Macaíba, pertencente à Grande Natal e onde serão implantados os centro de educação científica infanto-juvenil e de saúde materno-infantil, o Índice de Desenvolvimento Humano é mais baixo ainda. A educação no Estado não é somente precária em termos quantitativos – reduzida taxa de escolarização da população em idade escolar – mas também em termos qualitativos, ou seja, grande parte dos alunos que termina a 4ª série do ensino fundamental continua sem saber ler e escrever.

Outra razão da escolha de Natal como sede do IINN é a idéia de Nicolelis de descentralizar a ciência e pesquisa no Brasil que se concentra tradicionalmente no eixo Brasilia – São Paulo – Rio e na Região Sul do país. A partir de Natal, que o cientista quer transformar em centro biotecnológico do país, poderá ser atendido o Nordeste e o Norte, regiões consideradas como celeiros para o descobrimento de novos talentos.

Conclusão

O Instituto de Neurociências terá uma influência altamente positiva na sociedade de Natal e de seus subúrbios. Despertando o interesse dos jovens na ciência e pesquisa, acolhendo e orientando-os nos centros educacionais, novas perspectivas lhes serão oferecidas. Essa oferta aparece em boa hora, porque o turismo de massa ligado ao turismo do sexo se avoluma cada vez mais em Natal, prejudicando não somente os jovens, mas toda a sociedade. Como a pesquisa científica aplicada à sociedade é relativamente nova em Natal e no Nordeste em geral, aos jovens pesquisadores, agora e no futuro, será oferecido um profícuo e amplo mercado de trabalho.

Links:

www.natalneuroscience.com: IINN- Instituto Internacional de Neurociências de Natal.

www.revistapesquisa.fapesp.br: 07/02/2007, “Conexões sem fronteiras”.

www.sbnec.org.br: Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento.

www.cartacapital.com.br/edicoes/2007//01/427/vendedor-de-sonhos. Entrevista com Miguel Nicolelis.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Livro que pode revelar lado coisas da política do RN

Jorge de Senna, um escritor

potiguar desconhecido (III)


 

Texto e pesquisa de Luiz Gonzaga Cortez.


 


 

Jorge Rodrigues de Senna, o ilustre escritor e bom contador de histórias e "causos", além de ficcionista e memorialista, não pára de escrever e prepara um novo livro para os próximos 12 meses, a ser lançado em Goiânia/GO ou em Parelhas e Natal. Não revela o título. Antes do lançamento, virá ao Rio Grande do Norte para receber uma homenagem da Câmara Municipal de Parelhas. Após muitos anos sem contactos com os políticos potiguares, ele retornará para ser homenageado pelos vereadores de sua terra natal. E por lembrar dos políticos, um dia Sr. Jorge poderá ser motivo de estudos de pesquisadores que se interessarem pelo coronelismo do RN. È um assunto pouco estudado pelos nossos intelectuais, talvez porque seja considerado tema espinhoso, difícil e perigoso. E vou dar uma sugestão para o "gancho" , isto é, que os pesquisadores sociais leiam o primeiro livro dele, "Depois do Expediente", publicado em 1994. O nossos "coronéis" não eram somente patriarcas, empreendedores e desbravadores dos sertões, mas, também, patrocinavam muitas patifarias, arruaças, crimes eleitorais e contra a vida. E nos períodos eleitorais, vixe Maria, acontecia de tudo, meu irmão.

Para você, caro leitor, ter uma idéia do que acontecia nas campanhas dos anos 40/50/60, no território potiguar, os majores e coronéis da baixa política mandavam e desmandavam na administração e na polícia. Vou transcrever um trecho sobre um fato ocorrido naqueles tempos, sem data e localidade, porque Jorge de Senna trata as pessoas por codinomes ou nomes parecidos com as verdadeiras identidades. Entendeu? Então, vamos lá. Na página 96 do citado livro, inicia a crônica "Nomeação por ato de bravura" , na qual ele conta parte da história de um biriteiro e arruaceiro que foi nomeado fiscal de tributos do Estado. Um patife que enganava até a mãe, nominado por "Benedito Guindaste", pois era uma lapa de homem.

---- "Todo mundo sabe que ele entrou pro serviço de fiscalização por via da proteção que lhe deu o deputado Talarico Bezerra. Esse era um que vivia às turras, disputando voto no tapa, com o deputado Leite Filho. Ali em Mofumbal, quem não era eleitor de um , votava no outro e era sempre incitado a odiar os adversários. Foi por isto que num dia de comício do deputado Leite Filho, Benedito Guindaste ajuntou-se com Quincas das Onças e se danaram a beber até à hora de começarem os discursos. Tinham falado só dois oradores. Ainda faltavam bem uns dez. Tinha gente da Macambira, Zangareia, Onça Rajada,Bosteiro... de tudo quanto era lugar povoado do município. Pracinha principal dura de gente. Foi nessa hora que chegaram os dois, mal conseguindo equilibrar-se nas pernas. Num carrinho de mão conduziam a jaula com o casal de felinos. Foi Quinca que tinha pegado as duas em armadilha na Serrado Ermo, pra vendê-las ao Circo Temperani, como sempre fazia.Mas a necessidade de fazer mal aos outros, os adversários políticos, era maior do que a necessidade de ganhar dinheiro. Abriram a jaula e gritaram ambos: "Olha as gatas, negrada!....

Não ficou viv'alma na pracinha do coreto. Só se via gente correndo pra todo lado. Os feídeos esturrando, desesperados. Gente trombando com gente. Onças passando no meio das pernas, tontas com a gritaria. Gente caindo e outros passando por cima. Foi um destempero dos diabos. Mas no fim, só escoriações leves. Ninguém machucado grave. Prejuízo mesmo, só levou o Hermano Espanhol. No outro dia, amanheceu só a ossada de um dos bezerros dele. Nunca mais Quinca viu suas onças. Nem ele nem ninguém. Mesmo assim permaneceu o apelido. Contavam que o deputado Bezerra precisou trocar a calça e a roupa de baixo, de tanto rir, quando lhe contaram o caso. Aí reuniu-se o Diretório Municipal do Partido. Foi lavrada a Ata, ingirgindo o aproveitamento dos dois no serviço público e assim foi feito. Governo era pra isto, pra prestigiar quem, por qualquer meio, avacalhasse a Oposição. A façanha foi considerada ato de bravura". Quincas e Benedito Guindaste foram nomeados e ficaram hospedados no Hotel do Deputado Talarico, onde os garçons receberam ordens de servir cervejas aos dois, à vontade, durante uma semana, enquanto aguardavam o Diário Oficial do Estado com as nomeações.

Acredito que o episódio ocorreu antes da famigerada Chacina de Cachoeira do Sapo, onde várias pessoas foram assassinadas por questões eleitorais, a mando de um deputado estadual que nunca cumpriu a pena integralmente porque foi defendido por um bom advogado criminalista já falecido, ligado ao grupo político que "administrava" o Estado do Rio Grande do Norte.


 

Luiz Gonzaga Cortez é jornalista e pesquisador.


 

terça-feira, 13 de julho de 2010

Parelhense brilha na literatura goiana .

Jorge de Senna, um escritor

Potiguar desconhecido. (2)


 

Luiz Gonzaga Cortez. *


 

Não é somente Jorge Rodrigues de Senna que é esquecido pelos autores de antologias de escritores e contistas norte-rio-grandenses. Existem inúmeros poetas omitidos das listas literárias, como são os casos de Estefânia de Azevedo Mangabeira de Barros, do século passado, nascida em Macaíba, Geraldo do Norte (WWW.opoetamatuto.com.br) e Tertuliano Pinheiro, estes de Parelhas/RN.

O parelhense que brilha, depois que publicou "Depois do Expediente", em 1994, lançou o seu segundo livros de contos e memórias, "Frutos da Insônia" (104 páginas), considerado pelos críticos goianos como uma obra com viés sociológico, "de olhos vivos no real, servindo ao ficcionista que desta feita, caminha pelo terreno da crônica confidente". Jorge de Senna, mais uma vez, é elogiado por Brasigóis Felício, no prefácio de "Frutos da Insônia", onde ele escreve: "Não hesito em dizer que os leitores não gastarão em vão o tempo que dedicarem à leitura desses FRUTOS DA INSÔNIA. São frutos da terra, colhidos pela sabedoria humana, espírito de observação, e no senso de humor deste potiguar que escolheu Goiás para viver, trabalhar, e criar sua família. Radicado no rico torrão goiano (e atualmente devastado pela "sojeira pura" da monocultura agrotóxica intensiva), Jorge de Senna não perde o contato com suas raízes". Brasigóis considera que Jorge de Senna cavouca as solidões do passado, mergulhando, com seu talento de cronista e historiador nos acontecimentos mais marcantes da política potiguar, com "certeiras lancetadas no carnegão da política da província, com seus coronelismos, e outros ismos impronunciáveis, em face de uma falsa modernidade".

Realmente, segundo informações colhidas, Jorge de Senna não perde suas ligações com o Rio Grande do Norte, visitando Parelhas, onde nasceu no povoado Juazeiro, em 27 de abril de 1922, e Natal. Aqui, ele não perde uma oportunidade de "baixar" no antigo "Grande Ponto", na rua Princesa Isabel, para matar as saudades, pois, ali pertinho, morou na casa de nº 227 da rua General Osório, onde existiu uma "república" de estudantes nos anos quarenta. No pensionato, conviveu com Alonso Bezerra de Albuquerque e José Orontes Pires Galvão (falecidos), além de Lauro Pires Galvão, Neto Queiroz, Noé Assunção, Bianor Trigueiro Costa, dr. Chiquinho Vasconcelos Galvão, Fernando Umbelino, de Santa Cruz, irmão de Pindoba e João Umbelino.

"Ainda não havia a Rádio Difusora de Natal. Ou seria a Rádio Educativa? Confesso a minha dúvida. O serviço de auto-falantes de Luiz Romão estava no auge. Foi nessa época que o cantor Silvio Caldas fez uma "Noite de Seresta" naquela casa de espetáculos. Quem duvidar, procure os anúncios em "A República" dos primeiros meses de 1940 e verá que a cachola deste macróbio ainda funciona. Lembro-me de que antes de Sílvio entrar no palco, um locutor de fora, chamado Bulhões, fez longa leitura, apresentando "o artista de voz cristalina como água que jorra de uma ânfora", para deleite da imensa platéia que lotava aquela então requintada casa, freqüentada pela nata social da época. O leitor já deve estar perguntando:

---E por que o velhote não diz o que o teria levado a achar que já era homem, naquele tempo? Não se aperreie ,não,meu bichim, eu lhe digo: foi naquela noite gloriosa que eu me sentei, pela primeira vez, com uma namorada, para assistir a uma diversão, como faziam os outros rapazes mais velhos e melhormente situados na vida. Além de ter sido a primeira vez que abracei uma namorada, outro acontecimento, ruim a danar, ficou-me gravado na memória: dirigi-me ao Rex, naquela noite, ignorando o preço de casa entrada. Lá chegando, na bilheteria, fui informado de que custava a bagatela de cinco mil reis, cada uma. Comprei as duas por dez, é claro, todo o meu capital e assisti Silvio Caldas, com o braço sobre os ombros dela e uma dor, não sei onde, causada pela certeza de que voltaria a pés, para a Ribeira, vez que não sobrara um único tostão. Terminada a apresentação, aleguei dor de cabeça, enxaqueca, despedi-me às pressas, no ponto do bonde e parti rumo à Praça Augusto Severo para onde tínhamos mudado, meses antes. Enxuguei o suor e dormi feliz. Ali, ocupava, com Lalu Galvão, um quartos dos fundos, no terceiro andar, quarto este situado ao lado de outro, um pouco mais confortável, onde residia o já então maduro solteirão Luiz Maria Alves".

Liso, Jorge de Sena, na semana de carnaval de 1941, viajou para Recife, onde embarcou no navio "Itaquatiá" para o Rio de Janeiro, iniciando a sua saga em busca de trabalho e melhores dias. E diga aí, caro leitor, com quem Senna viajou para Recife? Luiz Maria Alves, por derradeiro.

"Frutos da Insônia" tem muitas crônicas com os "causos" vividos pelo escritor parelhense, a vida social e política de Natal, Parelhas e Goiânia-GO. O livro foi editado pela Editora AB, rua 15, nº 252, Qd. 34, Lt. 34, Setor Central, Goiânia-GO . Tel. (062) 225.2010 e fax 229.4109.

Luiz Gonzaga Cortez é jornalista e pesquisador.

domingo, 4 de julho de 2010

Parelhense brilha na cultura goiana


 


 

Jorge de Senna: um

Escritor esquecido no RN (1)

Luiz Gonzaga Cortez.


 

Foi através de Zequinha Marcolino, bancário aposentado, companheiro de caminhadas, que tomei conhecimento de Jorge Rodrigues de Senna, potiguar de Parelhas, um dos nossos escritores que não estão enfocados nas antologias da literatura do Rio Grande do Norte. Pois é, o octogenário Jorge R. de Senna, um misto de contador aposentado, escritor e jornalista, autor de cinco livros de contos, crônicas e artigos, é integrante da Academia de Letras Goiás, Estado onde reside há mais de 50 anos, mas sempre vem à sua terra natal para participar dos festejos religiosos do Padroeiro da cidade de Parelhas, São Sebastião.

Jorge de Senna foi descoberto e incentivado por um dos grandes escritores goianos, Brasigóis Felício, autor do prefácio do seu primeiro livro, "Depois do Expediente" (1994), através do qual, em 2009, me embeveci com os seus contos e relatos da vida cotidiana de Goiás e da política coronelista potiguar nos anos 40/50 do século passado, além dos "causos", dos fatos tragicômicos e dramáticos. Há relatos verídicos que servirão de subsídios aos pesquisadores acadêmicos da área de ciências sociais, apesar dos seus personagens terem suas identidades referidas por pseudônimos,como os envolvidos nas tramas e crimes da baixa política potiguar da antiga UDN e PSD.

Na sua primeira incursão literária, Jorge de Senna homenageia seus pais, esposa, Marlaine, e filhos, através de textos que asseguram "ser um arguto observador da alma humana, no que tem, o bípede pensante, de ridículo e imponente, divino e demoníaco". E prossegue Brasigóis: "Li este livro de um fôlego só, reforçando minha convicção: a que, para se fazer literatura, há que se ter, como matéria prima primordial, boa linguagem, capacidade narrativa, (em que se equilibram, artisticamente, a opulência e a síntese)—além, é claro, do senso de humor, quando se tratar de cenas pícaras, ou anedóticas, e visão do trágico, quando o drama ensombrecer de medo e de angústia, as ações humanas. E isso este Autor potiguar tem, senão se sobra, mas, ao menos, o suficiente para prender o leitor. Que mais se pode exigir, de alguém que se dedique ao ofício de escrever? Não há, nas estórias de Jorge de Senna, as filigranas e os laboratórios herméticos, em que nadam, de braçada, certas barulhentas e estéreis vanguardas. Seus recursos narrativos são os tradicionais, sendo suas estórias estruturadas pelo velho e bom começo, meio e fim, sem que seja, por isso, previsíveis e insossas. Bem ao contrário, seus contos têm tônus, tensão dramática e riqueza conteudística, como é exemplo a peça "O Boca de Praga", onde se lê a pérfida ou inocente ironia que viceja nas repartições públicas transformou um Malaquias Souza Vale em Malaquias Sem Valor, só pelo fato do alcunhado, para economizar tempo ou tinta, grafar seu nome como "Malaquias S/V"....". Há figuras denominadas Zidorão, Cabo Jacinto, Brejuí, Zé Mocó, Zitinha, Ana Medalha,Carival, Orontes, Pedro Bonzo, Abílio Pé de Cana, Aninha Sem Tripa, Cicero Suruba, Talarico Bezerra, Leite Filho, etc., mas vou parar por aqui porque isso é outra história.

Luiz Gonzaga Cortez é jornalista e pesquisador.

sábado, 12 de junho de 2010

Em 2010, ainda se comenta sobre o

Dicionário do Folclore Brasileiro,

uma obra de Cascudo mutilada .


 

Luiz Gonzaga Cortez


 

O jornalista e poeta Celso Dantas da Silveira partiu sem receber uma satisfação da editora que publicou a última edição do Dicionário do Folclore Brasileiro, de autoria do potiguar Luís da Câmara Cascudo, com a exclusão do verbete criminoso, colaboração do intelectual assuense. O Dicionário foi outro mutirão que Cascudo fez, que redundou em inúmeras transcrições de verbetes elaborados por pesquisadores e folcloristas de todo o Brasil (parte deles relacionados na página XVIII da segunda edição, de 1962, feita pelo Ministério da Educação e Cultura e o Instituto Nacional do Livro). Celso me procurou em 2002, num dos intervalos de um Circuito Cultural Banco do Brasil, em frente ao estádio Machadão, para sugerir que eu fizesse uma reportagem sobre as capações feitas na grande obra de Cascudo, isto é, a retiradas de várias verbetes publicadas em edições anteriores, sem a autorização do autor, tais como criminoso e abusão. "Não se faz uma coisa dessa, é um crime", disse-me. Em seguida, pediu para ir na sua casa para exibir as provas. E mostrou-as, além da carta eletrônica que mandou para a Editora Global, em 2002.

No imeio que Celso da Silveira mandou para global@dialdata.com.br , ele registra que constatou que na edição "Revista, atualizada e ilustrada" houve "inaceitáveis mutilações parciais e até supressões de alguns verbetes e adulterações nas chamadas remissivas que se encontram na obra básica do mestre Luís da Câmara Cascudo, em termos comparativos com a segunda edição de 1962, do INL".

"Durante 39 anos, ao longo de seis ou sete edições seguidas desse livro, foi mantido o verbete CRIMINOSO, jogo juvenil praticado nos anos 40 na cidade do Assu (RN) e Itabaiana (PB), agora suprimido pela professora Laura Della Mônica, falecida recentemente, conforme me foi comunicado pela comissão Nacional de Folclore, cuja presidência é ocupada pelo eminente folclorista pernambucano Roberto Benjamin. Mesmo respeitando a memória, seu conhecimento e erudição e reconhecendo o respeitável cabedal da doutora Laura, em etnografia e folclore, não posso deixar sem registro as lamentáveis omissões encontradas em seu trabalho. O próprio Cascudo, em texto explicativo introdutório ao DFB, diz: "ninguém estuda pré-história, história natural, geologia pelos elementos componentes, REDUZINDO, o material examinado..." e finaliza afirmando que "TODAS as coisas aqui registradas participam indissoluvelmente da existência normal do homem brasileiro". Numa rápida análise da edição Global, pode-se verificar que inúmeros verbetes remissivos foram modificados, de certa forma descaracterizando a obra original. Cito apenas alguns exemplos. Na letra C o verbete crendice pede uma chamada (edição do INL) para abusão. Na edição Global crendice mudou para superstições e suprimiu abusão, na letra A. Abusão, na edição do INL, está abonada pelo livro V, título 3, parágrafo 3 DAS "Ordenações Filipinas".

Acreditava Celso da Silveira que o trabalho da professora Laura Della Mônica foi feito "às pressas, sem revisão da autora antes da publicação" e não deu aos estudiosos as razões sobre a supressão dos verbetes da edição original de Cascudo. "Em folclore nunca se deve suprimir registros de manifestações de costumes e sim acrescer com achegas os verbetes que surgem geograficamente na cultura popular. Quanto mais abonações, mais os fatos folclóricos ampliam a importância do fenômeno lingüístico. Nunca é prudente suprimir, quanto mais quando se trata da obra de um sábio genial do quilate de Luis da Câmara Cascudo", lembrou Celso, que integrava a Comissão Estadual de Folclore do RN. Celso da Silveira fez várias gestões para receber um esclarecimento, inclusive ao seu amigo Roberto Benjamim, em 22 de abril de 2002, a quem escreveu pedindo ajuda para a restauração do verbete criminoso, que desapareceu do Dicionário do Folclore Brasileiro depois de quase 40 anos. Cascudo aproveitou o verbete após ler um artigo de Celso da Silveira no jornal A República, em 1962. A propósito, desconheço qualquer iniciativa dos herdeiros da obra de Cascudo para restaurar as supressões da última edição do DFB, mas sei que são do conhecimento deles.

domingo, 30 de maio de 2010

Nati Cortez e Lilia Galvão

Esta foi tirada por João Maria Cortez Gomes de Melo numa praia de Natal, em 1957. À esquerda, a poetisa Nati Cortez (Maria Natividade Cortez Gomes) e dona Lilia Galvão, que foi residir no Rio de Janeiro poucos meses depois. Ambas conheceram a poetisa e atriz de teatro Didi Câmara, que residia na Tijuca, onde constituiu família com o ator Fernando Cardoso. Do arquivo de João Maria Cortez.
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Cometa, um poema de Didi Câmara


 

Luiz Gonzaga Cortez *


 


 

Pegando carona nas crônicas publicadas na imprensa natalense, andei procurando nos meus papéis velhos, alguma coisa sobre a poetisa Didi Câmara. Encontrei pouco, mas continuo procurando as cartas que ela teria enviado para a minha mãe, Maria Natividade Cortez Gomes, sua amiga de infância, em Natal. Irmãos mais velhos me informaram que elas se corresponderam muito há 30/40 anos atrás. Didi Camara no Rio de Janeiro e Nati Cortez, como era mais conhecida, na Rua Felipe Camarão, Cidade Alta, em Natal. Quando menino, eu ouvia falar sobre duas amigas de minha mãe: Lilia Galvão e Didi Câmara. Dona Lilia eu conheci, morou em frente à nossa casa. Eu não me lembro de dona Didi Câmara, mas há quem afirme que ela visitou mamãe, aqui, na província potengina. Já achei várias cartas remetidas para ela (Nati), mas não achei as de Didi Câmara. Entretanto, encontrei uma edição incompleta da revista JURITI, editada por Aluizio Macedônio Lemos, chefe integralista de Ceará-Mirim/RN, com um poema de Didi Câmara. A revista não tem páginas numeradas nem a data da edição, mas, presumo, que seja de novembro ou dezembro de 1938, pois traz uma notícia sobre as comemorações do 1º aniversário do golpe de estado que implantou a ditadura do Estado Novo em 10 de novembro de 1937.

Chama-se "COMETA" o poema de Didi Câmara, oferecido ao Padre Luiz Gonzaga do Monte. Transcrevo, conforme o original publicado, o poema escrito décadas antes do nascimento do compositor e cantor Raul Seixas e do movimento dos ufologistas.     

"Nasci numa longínqua nebulosa,

Há milhares de séculos passados,

Em pleno céo aberto e infinito.

Sou filho vagabundo dos espaços

E irmão das estrelas.

Percorro lesto distancias inauditas,

Dentro do caos profundo deixo rastros

De luz e uranolitos.

Se o que vi podesse, eu vos diria,

Dentro de minha vida luminosa,

Desde que vim da erma nebulosa,

Que já nem sei onde está...

E que foi o meu berço colossal,

Feito de ouro, verde e cor de rosa:

Em volteios gracis, qual fulgurante

Aza ciclópica de gigantesca ave.

Pelos espaços vi alviçareiros mundos,

Que giram sobre, e pelos céos profundos,

Da estrada eterna a interminável senda:

Globos acesos e volteando aos pares

Quais falenas de prata, aos milhares,

Numa dansa fantástica de luz

Toquei o solo rubro de estrelas,

Onde colhi encantos de mil cores,

A corôar minha cabeça e onde puz

Mais formosos matises, como flores.

Vi delírios de fogo, altas chamas,

Tempestades astrais, igneas tragedias,

Onde desapareceram de repente,

Os mais lindos sois.

Contemplei as batalhas siderais,

Onde cada soldado é uma estrela,

Que disputa um sistema em formação...

E seguirei sempre aventureiro de luz,

Pelos espaços infindos, eternamente abertos

Pelos céos de safira sempre azuis...

Até que um dia nessa marchar exul,

Possa tomar-me um sol no seu bojo de chama

E sepultar-me a fluida cabeleira,

Numa formosa e rubra sepultura,

Que ao choque de meu corpo ainda mais se inflar

Em torrentes de fogo pela altura!".

Nota: As expressões " lesto", "exul" e "gracil" não são erros de revisão. Estão registradas no "Aurélio" há décadas, informa Nei Leandro de Castro. Eu desconhecia, mas lesto significa rápido, ligeiro, ágil grácil é o mesmo que delicado, delgado, fino, sutil. Exul, o mesmo que exule, é exilado, desterrado. Creio que o final do bonito poema seja "Em torrentes de fogo pelas alturas!". Franklin Jorge escreveu que esteve no Rio de Janeiro, em 1970, num dia de jogo da seleção brasileira e encontrou Didi Câmara com várias amigas e que não deu importância ao visitante, mas lembra-se de que falou sobre Natal e Nati Cortez, tendo dona Didi comentado que isso é coisa muita antiga, que já passou, etc. Tudo bem, está certo Franklin quando diz que ela não o recebeu bem. Já a minha irmã, Cecília, que reside no Rio de Janeiro desde 1974, disse-me que naquele ano, visitou Didi Câmara com mamãe e que ela recebeu muito bem, tomou chá com a gente, que riu muito quando conversaram sobre Natal da infância delas. "Me pareceu uma mulher muito simpática, risonha e era amiga de mamãe. Só a vi uma vez, apesar de morar bem pertinho, na Tijuca. Na ocasião , ela estava com uma filha e uma neta,que devem morar aqui ainda, mas não me lembro do endereço dela", disse a engenheira Cecília Cortez Gomes.

Luiz Gonzaga Cortez Gomes, jornalista e pesquisador.

Texto redigido em 17.04.2010.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Sérgio Resende em Natal

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Ministro reconhece trabalho da física

No rápido e improvisado discurso proferido na manhã de hoje, 24, na entrada do Departamento de Física Teórica e Experimental da UFRN, o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Resende, elogiou o dinamismo da atual gestão da Universidade Federal e parabenizou o trabalho do professor e doutor em física, Liacir dos Santos Lucena, coordenador das pesquisas do petróleo naquela instituição, em convênio com a Petrobrás. O reitor da UFRN, Ivonildo Rego, também elogiou o professor Liacir como um pesquisador que está sempre começando um novo projeto de pesquisa, um homem "que está sempre começando".
O físico Sérgio Resende, que sempre ajudou os físicos da UFRN, disse, ainda, que a persistência e dinamismo da UFRN e, por isso, os resultados vão aparecendo. Ele lembrou a crise mundial do petróleo na década de 70 do século passado, que prejudicou o crescimento do Brasil, por causa do endividamento junto aos bancos externos para a enfrentar a escassez de combustíveis. Com a colaboração de pesquisadores e cientistas brasileiros, em universidades públicas do Rio de Janeiro, inicialmente, foi criado o Proálcool (Etanol) para substituit a gasolina. Hoje, o Brasil produz e consome 50% de etanol nacional e é o líder mundial em biocombustíveis. Graças as pesquisas desenvolvimentos por brasileiros nos centros de pesquisas da UFRJ, PUC do Rio de Janeiro, a pedido da Petrobrás, o país criou tecnologias avançadas para a pesquisa e prospecção de petróleo em águas profundas, tornando a Petrobrás a líder mundial no setor. "O desafio é muito grande. A rede de pesquisadores em todo o Brasil, em várias áreas, trará conhecimentos importantes para o Brasil utilizar os recursos do Pré-Sal nas águas profundas em benefício da humanidade", disse o ministro Sérgio Resende.

Ministro na UFRN

O ministro da Ciência e Tecnologia, Eliseu Resende, às 9 horas de ontem, inaugurou os novos lab0ratórios de pesquisas do Petróleo e o prédio do Instituto Internacional de Física, no Campus da UFRN, em Natal/RN , em solenidade que contou com a presença do Reitor Ivonildo Rego, professores, estudantes, cientistas nacional, dirigentes da Petrobrás e representantes do Governo do Estado e do CNPq. O professor Liacir Lucena, coordenador do processo que gerou vários estudos nos chamados sistemas complexos e da busca de novos métodos e técnicos de extração de petróleo no Brasil, disse que os novos laboratórios faz parte dos esforços dos físicos para buscar soluções para os gargalos que existem no desenvolvimento tecnológico brasileiro, principalmente agora com a descoberta da camada do Pré-Sal. "Os problemas são cada vez mais difíceis e desafiadores. De cada três barris de petróleo extraídos da camada terrestre, apenas um barril é aproveitado, se desperdiçando dois barris. Por isso, cabe aos físicos encontrar novos métodos e técnicas para dimiunuir esse desperdício. Os problemas são difíceis, são grandes, por isso que os físicos estão aqui, trabalhando, pesquisando, porque se fossem fáceis, eles não estariam aqui", disse Liacir Lucena, falando descontraidamente.
Liacir alinhou algumas linhas de pesquisas desenvolvidas nos laboratórios da UFRN que redundaram em prêmios para os físicos locais, tais como um novo método de decovulação, metódos de estatísticas, algoritmos baseados em escalas expectrais, teoria da percolação, um simulador e novas técnicas que tentam oferecer a Petrobrás e empresas da área petrolífera.
A professora Maria Célia de Andrade, do corpo docente do CEI-Mirassol, a primeira escola particular do Rio Grande do Norte a elaborar um projeto de iniciação científica para estudantes de nível médio, entregou ao Ministro Sérgio Resende, uma cópia do documento que visa a implantar uma mentalidade no seu alunado que possa, no futuro, colaborar para o desenvolvimento tecnológico do Brasil.
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segunda-feira, 3 de maio de 2010

Professor Tiago Gomes


 


 


 

Um porteiro, paraibano de Picuí, fundou a CNEC

Em Recife e foi tachado de comunista.

Luiz Gonzaga Cortez.


 

O fundador, o Pai, o inventor da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade-CNEC, denominação atual, foi o paraibano de Picuí, Felipe Tiago Gomes e tudo começou na capital pernambucana, Recife, onde ele era o porteiro da Casa do Estudante de Pernambuco. Felipe Tiago Gomes se inspirou na experiência do peruano Haya de La Torre, após ler o livro "Drama da América Latina", de John Gunther. A Campanha do Ginasiano Pobre foi lançada no dia 30 de agosto de 1943, através de um boletim impresso pelo grupo de 5 estudantes pobres: Felipe Tiago Gomes, Carlos Luis de Andrade, Florisval Silvestre Neto, Joel Pontes e Eurico José Cadengue. Foram esses rapazes que participaram da primeira reunião realizada no Ginásio Pernambucano, hoje Colégio Estadual de Pernambuco. A idéia contou com a adesão de Genivaldo Wanderley e José Irineu, impulsionando o movimento em plena Segunda Guerra, o que teria possibilitado o surgimento da desconfiança das autoridades civis e militares diante dos boatos de que era "coisa de comunistas". Ajudar os pobres era coisa de comunista. O que queria Felipe Tiago Gomes era ajudar os ginasianos pobres, desamparados e desempregados quando terminavam o primeiro grau, servindo de massa de manobra dos politiqueiros e dos coronéis dos sertões nordestinos, além "de acender novas luzes nas inteligências de dezenas de rapazes pobres, que apenas têm o curso primário e não podem, por motivo financeiro, continuar seus estudos".

Os jovens causaram tremendo "rebu" em Recife durante os festejos da Semana da Pátria, quando lançaram um manifesto no dia 7 de setembro de 1943, conclamando os estudantes a se irmanarem na campanha "Um ginásio para o pobre!". O panfleto foi redigido por Alcides Rodrigues de Sena, colega de Felipe, e pedia ajuda da mocidade para formar fileira na campanha, do estudante rico para estirar "em auxílio do jovem anônimo e inteligente que também deseja, quer estudar".

A Campanha se expandiu e em 21 de março de 1944 o grupo, que ainda divulgava seus objetivos e já tinha dialogado com os oficiais do Exército e da Marinha e líderes católicos de Pernambuco, Ceará e Pará, mandou uma carta para o escritor Luís da Câmara Cascudo, convidando-o para proferir palestra em Recife durante a Semana de Cultura Nacional. Cascudo não aceitou o convite por causa dos compromissos assumidos.

Outro fato que chamou a atenção das autoridades de Pernambuco foi a campanha "De pé também se aprende", com mais de 100 alunos. O fato é que eles não conseguiram cadeiras e carteiras para os alunos e lançaram panfletos dirigidos aos usineiros, industriais, comerciantes e agricultores, a fim de obterem recursos para aquisição de carteiras e tamboretes para os ginasianos pobres. O general Isauro Regueira, Comandante da Sétima Região Militar, na entrada do Teatro Santa Isabel, ao receber um panfleto, parou para lê-lo e, em seguida, procurou o grupo de estudantes para conhecer a Campanha do Ginasiano Pobre, denominação primitiva da hoje CNEC, que já foi CNEG, Campanha Nacional de Educandários Gratuitos.

A "História da CNEC" ( Brasília, 1980) está contada por Felipe Tiago Gomes, responsável pela vinda da Campanha ao Rio Grande do Norte, em 1948, onde ele e sua comitiva foram recebidos pelo governador José Varela e secretários, colocando o jornal do Governo, A República (vide edição de 2 de outubro de 1948) à disposição do movimento. A primeira diretoria da CNEC não tem nenhum nome do RN, mas em 1949, quando Felipe Tiago Gomes já residia no Rio de Janeiro, nosso Estado já tinha um delegado da instituição, o sr Luís C. Soares. Em 1950, houve um congresso da CNEC que elegeu a seguinte diretoria: Presidente Felipe T. Gomes; Antunes de Oliveira, segundo vice-presidente; Péricles de Souza Dantas, segundo vice; Dulce Oliveira Vermelho, secretário-geral; Bráulio Cortês Xavier Bastos, primeiro secretário; Norma Fonseca Paixão, segundo secretário; João Antonio Monteiro, tesoureiro. No seu livro, Felipe T. Gomes registra os nomes de todas as autoridades civis e militares, dirigentes do MEC, parlamentares, que ajudaram a CNEC, entre 1943 e 1980, inclusive o ex-Presidente Café Filho, potiguar, Presidente de Honra da campanha, os falecidos cardeais Dom Avelar Brandão Villela e Helder Câmara. Nas 156 páginas do seu livro, Felipe Tiago Gomes, que não historia a CNEC potiguar, não registra nenhum nome de sacerdote católico do RN que tenha implantado a Campanha no RN. O que eu sei, por ouvir dizer, é que a CNEC entrou em decadência quando passou a ser cobiçada pelos políticos de "olhos grandes" nos seus caixas. Aí, meu caro, "a vaca foi brejo", a partir da década de oitenta. Mas isso é outra história... Vige Maria!

Luiz Gonzaga Cortez é jornalista e pesquisador